7 de outubro de 2024

A reinvenção do ensino público

Vivemos hoje, no Brasil e no mundo, um dos períodos mais desafiadores para a educação, área que, por si mesma, já tinha em nosso país desafios históricos e complexos antes da pandemia da Covid-19. O quadro atual representa a maior crise para a educação brasileira nos últimos 100 anos e seu impacto sobre o ensino público é ainda maior, tanto pela proporção de matrículas como pelas graves consequências sobre os indicadores educacionais — com destaque para a aprendizagem e o fluxo escolar.

Por quase todo o ano de 2020, aproximadamente 50 milhões de estudantes ficaram sem aulas presenciais no Brasil. Mais grave, estima-se que, em meados de 2020, a cada dez estudantes brasileiros, dois não recebiam atividade alguma. O cenário, jamais imaginado por qualquer gestor ou educador e, por isso, de muitas incertezas, precisou ser enfrentado a partir de um planejamento emergencial, em ritmo acelerado e sem qualquer antecedência. A crise sanitária terminou por adicionar mais uma camada de enormes desafios às diferentes realidades estaduais que tão bem conhecemos. Ainda assim, é possível extrair coisas positivas de realidades que, por si mesmas, não são favoráveis.

No caso da educação, o grande mérito que a pandemia teve foi recolocar no centro do debate os verdadeiros problemas do ensino público brasileiro, como a exclusão digital, os problemas de aprendizagem, a formação de professores, dentre outros. Vale lembrar que a atual geração de secretários estaduais de Educação assumiu suas respectivas pastas num contexto político e social bem distinto, em que muito se discutia a educação, porém nem sempre a partir de seus problemas principais ou mesmo de problemas concernentes à própria área.

Nesse sentido, a pandemia teve o condão de despertar um olhar atento e sensível de todo o país para questões efetivamente importantes. Não por coincidência, em meio a tantos obstáculos, foi precisamente no ano passado, em meio à pandemia, que conseguimos aprovar o principal fundo de financiamento à educação brasileira — um Fundeb permanente, ampliado e mais distributivo.

Há limitações significativas nas escolas públicas de todo o país, mas não podemos ignorar a reinvenção da educação que estamos vivenciando

Vitor de Angelo

Em 2020, muito se falou de um suposto “apagão” na educação. De fato, há limitações significativas nas escolas públicas de todo o país, mas não podemos ignorar a reinvenção da educação que estamos vivenciando. Por um lado, a histórica desigualdade socioeconômica revelada pela pandemia descortinou para todo o país o cotidiano de exclusão vivido por uma parcela numerosa dos estudantes atendidos pelas redes públicas. Por outro, os gestores e demais profissionais de educação tiveram que se reinventar diante dessa difícil realidade. Dessa forma, além de redefinir o foco das atenções dos gestores para o que realmente importa, é inegável que a pandemia também aumentou a velocidade de mudanças já necessárias.

Sem querer minimizar os limites e desafios da educação pública, que são muitos e exigem o empenho de todos, devemos colocar em perspectiva crítica a ideia do “apagão”.

Apesar de todas as dificuldades, o que temos visto é a reinvenção da educação pública no Brasil. Os professores, de maneira inovadora, passaram a criar canais no YouTube e grupos de WhastApp, realizar lives no Instagram e promover reuniões em aplicativos de webconferência — muitas vezes, numa abordagem temática e interdisciplinar, como há anos se vinha buscando. Portanto, somos testemunhas de que a crise decorrente da pandemia também tem sido aproveitada de forma positiva pelos profissionais da educação para, superando vários obstáculos, continuar garantindo o direito de aprendizagem aos alunos.

Vitor de Angelo é presidente do Consed

FONTE RDNEWS

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